As pessoas precisam criar rótulos para tudo o que sentem,
percebem, e para toda experiência. Precisam de uma relação de gosto/não gosto
com a vida, mantendo um conflito quase ininterrupto com situações e com
pessoas.
Será que isso é apenas um hábito que pode ser
rompido? Não é preciso fazer nada. Basta deixar que cada momento seja
como é. O ego não é capaz de sobreviver à entrega.
“Tenho tanta coisa pra fazer”. Muito bem, mas existe
qualidade no que você faz? Falar com clientes, trabalhar no computador,
realizar as inúmeras tarefas do seu cotidiano – você faz tudo isso com a
plenitude do seu ser? Quanta entrega ou recusa existe no que você faz? É essa
entrega que determina o seu sucesso na vida, e não a quantidade de esforço
empreendido.
O esforço implica estresse, cansaço e necessidade de
alcançar um determinado resultado no futuro. Se você percebe qualquer
indício interno que revele que você não quer fazer o que está fazendo, você
está negando a vida, e é impossível chegar a um bom resultado assim. Se você
percebe esse indício, também é capaz de abandonar essa má vontade e se entregar
ao que faz.
Quando você aceita o que é, atinge um nível mais profundo.
Nesse nível, seu estado interior não depende mais dos julgamentos feitos
pela mente do que é bom ou ruim. Quando você diz sim para todas as situações da
vida e aceita o momento presente como ele é, sente uma profunda paz interior.
A aceitação e a entrega se tornam muito mais fáceis quando
você percebe que todas as experiências são fugazes e se dá conta de que o mundo
não pode te oferecer nada que tenha um valor permanente. Ao aceitar e
entregar-se, você continua a conhecer pessoas e a se envolver em experiências e
atividades, mas sem os desejos e medos do “eu” auto-centrado.
Você deixa de exigir que uma situação, uma pessoa, um lugar
ou um fato te satisfaça ou te façam feliz. A natureza imperfeita de tudo pode
ser como é. A ironia é que, quando você deixa de fazer exigências
impossíveis, todas as situações, pessoas, lugares e fatos ficam satisfatórios,
harmoniosos, serenos e pacíficos.
Quando você deixa de resistir internamente, abre-se para a
consciência livre de condicionamentos, que é infinitamente maior do que a
mente humana. Essa vasta inteligência pode então se expressar através de
você e ajudá-lo tanto por dentro quanto por fora. É por isso que, ao parar de
resistir internamente, você costuma achar que as coisas melhoraram.
Você acha que estou lhe dizendo: “Aproveite o momento,
seja feliz”? Não. Estou dizendo para você aceitar este momento tal como
ele é. Isso já basta.
A aceitação e a entrega existem quando você não se pergunta
mais: “Por que isso foi acontecer comigo?”. A História mostra homens e
mulheres que, ao enfrentarem uma grande perda, doença, prisão ou a ameaça de
morte iminente, aceitaram o que era aparentemente inaceitável e assim
encontraram “a paz que vai além de toda compreensão”.
Há situações em que nenhuma resposta ou explicação satisfaz. Nesses momentos a
vida parece perder o sentido. Ou alguém em desespero pede sua ajuda e você não
sabe o que fazer ou dizer. Mas quando você aceita plenamente que não sabe,
desiste de lutar contra a resposta usando o pensamento de sua mente
limitada. Ao desistir, você permite que uma inteligência maior atue através
de você. Até mesmo o pensamento pode se beneficiar disso, pois a inteligência
maior flui pra dentro dele e o inspira.
Às vezes entregar-se significa desistir de querer entender,
e sentir-se bem com o que você não sabe. Quando você se entrega, a noção que
tem de si mesmo muda. O “eu” deixa de se identificar com uma reação ou um
julgamento mental e passa a ser um espaço em torno dessa reação ou desse
julgamento.
O “eu” não se identifica mais com a forma – o pensamento ou
a emoção – e você se reconhece como algo sem forma: o espaço da
consciência.
Deixe que a Vida seja!
Eckhart Tolle